Aproveitando o clima da Jornada Mundial da Juventude, que trás ao Rio de Janeiro exposições de artes sagras importantíssimas, inclusive uma com oratórios do Museu do Oratório, de Ouro Preto, vou falar sobre dois importantes oratórios barrocos que podem ser vistos na cidade: Um à Nossa Senhora do Cabo da Boa Esperança, na Rua do Carmo e outro no Mosteiro de Santo Antônio, no Largo da Carioca.
Quando da chegada da família real, em 1808,
a cidade do
Rio de Janeiro possuía quase uma centena de oratórios. Nichos com imagens que além
de congregarem os fiei para oração nas primeiras horas da noite, também serviam
de local onde as pessoas se socializavam. Como tinham sempre um candeeiro
aceso, iluminavam as ruas antes da instalação dos lampiões públicos - o que só
ocorreria em 1854.
Infelizmente não é fácil encontrar registros de todos esses
oratórios. Sabe-se dos que ficaram notáveis por uma ou outra razão. Havia um em
veneração à sagrada família que, por ter uma imagem representando-a quando da
fuga de Herodes, deu à via o nome de Rua do Egito. Logradouro que, após 1723,
passou a chamar-se Rua da Carioca,
quando se converteu em acesso ao chafariz do Largo da Carioca.
Outro que se pode citar ficava na entrada do Arco do Teles, na Praça VX e era dedicado à Nossa Senhora dos Prazeres. Este Arco
foi, por muito tempo, local de mendigos, vagabundos e prostitutas e, devido a
acontecimentos escandalosos presenciados pela imagem, um morador revoltado com
a profanação, removeu a santa imagem para a Igreja de Santo Antonio dos Pobres, onde está até hoje.
O oratório foi demolido.
E falando dos velhos oratórios, não posso
deixar de comentar sobre um do final do século 17 que durou mais de cem anos em
frente à Praia do Peixe, nos fundos da Igreja
Santa Cruz dos Militares, na Rua do Ouvidor.
Nesse local, um grupo de mercadores,
negociante estabelecidos, abriu um nicho e nele colocaram as imagens do Menino
Deus e de Nossa Senhora da Lapa. Seja pela força da imagem ou proteção da
Virgem, os negócios prosperaram muito, o que levou a erguerem a Igreja da Lapa
dos Mercadores.
Igreja da Lapa dos Mercadores |
Atualmente resistem apenas dois desses
oratórios em seus locais de origem.
Um deles, construído em 1763 pelo mestre
Manoel Alves Setúbal, para a Ordem Terceira do Carmo, é dedicado à Nossa Senhora
do Cabo da Boa Esperança e está na Rua do Carmo nº 38, nos fundos da Igreja da Ordem Terceira do Carmo.
O oratório como era originalmente |
Ainda que tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN), está abandonado e coberto por tapumes há quase duas décadas.
Oratório de 1763, dedicado a Nossa Sra do Cabo da Boa Esperança Rua do Carmo, 38 |
Em estilo barroco, o oratório é um marco
cultural e arquitetônico da cidade. As pedras gnaisse são brasileiras, os
azulejos e mármores, portugueses e o portão de ferro é do século 18.
Oratório de 1763, dedicado a Nossa Sra do Cabo da Boa Esperança |
A imagem veio de um oratório que existiu
no Morro do Castelo.
Em uma das paredes existia uma abertura
onde havia uma caixinha na qual os marinheiros portugueses, que seguiam para o
oriente, nas vésperas da partida deixavam oferendas ao pedir proteção à Virgem
para a travessia do sul da África. No regresso agradeciam, à Virgem, o bom êxito da
viagem.
Essa é uma relíquia que remonta às grandes
navegações e a imagem original, que é maravilhosa, se encontra na sacristia da
Igreja da Ordem Terceira do Carmo, na Rua Primeiro de Março.
Aproveito para transcrever um trecho do
livro de Vivaldo Coaracy, “Memórias da Cidade do Rio de Janeiro”, edição de
1988, pág. 238.
“Antes porém, de encerrar
essas breves notas sobre a Igreja do Carmo não é permitido deixar de mencionar
o oratório que se vê sobre o portão da passagem das duas Igrejas, na Rua do
Carmo.
Muita
gente passa por ali sem o ver, sem mesmo saber que existe.
É,
entretanto, uma das preciosas relíquia da cidade. Consagrado a Nossa Senhora da
Boa Esperança, é o último dos oratórios que, na velha cidade colonial, congregava,
às primeiras horas da noite, em certos dias da semana, um grupo de fiéis para
rezar o terço ou a ladainha.
As
lâmpadas que a devoção mantinha acesas todas as noites nesses oratórios
constituíram por muitos anos a única iluminação das antigas ruas. Pouco a
pouco, com a simultânea chegada do progresso e declínio da devoção, os
oratórios foram desaparecendo um após o outro. Hoje resta um só: aquele que se
vê na Rua do Carmo."
É bem verdade que ele andou um pouco...
Transferido em 1812 para a esquina seguinte, onde hoje se abre a Rua Sete de
Setembro, retornando ao local de origem em 1924.
Em 1948 foi erguido ao seu lado um prédio
de escritórios, onde, como se fosse uma sina local, estão ali sediadas a
Associação Nacional de Transportadores de Turismo, a Associação Brasileira de
Jornalistas Especializados em Turismo, A Turistrade e a Marc Apoio Consultoria
e Treinamento em Turismo.
Isso é que é um oratório com tradição em
viagens!!!
É muito triste um patrimônio riquíssimo
como esse está em estado de abandono e as pessoas privadas de admirá-lo.
O outro, em bom estado de conservação,
pode ser visto na entrada do Mosteiro de
Santo Antônio, no Largo da Carioca.
Há, ainda, o repositório em madeira com a imagem que ficava no
oratório na Rua do Ouvidor, origem
da Irmandade e da Igreja da Lapa dos
Mercadores. A relíquia é guardada na Sacristia e mostrada em ocasiões
especiais.
Imagem que ficava no oratório da Rua do Ouvidor, atualmente guardada no Mosteiro de Santo Antonio |
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