29 janeiro 2013

Vinho Jerez – único, variado, especial, versátil e delicioso


O Jerez é um vinho único, diferente de todos os outros. Na verdade Jerez não é um vinho, são vários. Pode ser extremamente seco, salgado até, ou muito doce, um néctar que escorre lento como mel pela taça. Apenas uvas brancas são usadas na produção, mas alguns desses vinhos são mais escuros que qualquer tinto: podem ser negros, impenetráveis, cor de piche. 



Jerez, ou Sherry, em inglês, é uma denominação espanhola para diversos estilos de vinhos produzidos na Andaluzia, na região entre as cidades de Jerez de La Frontera, Sanlúcar de Barrameda e El Puerto de Santa Maria. São vinhos de grande complexidade, feito a partir da mistura de vinhos de vários anos no sistema conhecido como solera. 





São vinhos espetaculares para serem apreciados com um belo prato de queijos antes da sobremesa, ou mesmo ao fim da refeição, sozinhos ou com um bom charuto. Para aperitivos, como queijo manchego, tortillas, jamóns, inclusive o exclusivo pata negra ibérico e tapas clássicos da Espanha, os tipos mais secos, simples e ligeiros, como Fino e Manzanilla, são a companhia mais que perfeita com o seu sabor picante e levemente salgado. 




A partir daí há várias categorias, que podem ter rótulos muito especiais, resultado da mistura de vinhos muito antigos, com mais de cem anos até. 
O Amontillado apresenta mais complexidade, com coloração âmbar e notas de oxidação, além forte presença de aromas amendoados no nariz e pode acompanhar pratos mais sérios. 
Já o Oloroso, que geralmente é seco, mas também pode ser doce, sozinho, é uma categoria à parte, englobando uma série de rótulos muito especiais, resultado da mistura de várias safras.
Existem verdadeiras obras-primas, os chamados VORS (Vinum Optimum Rare Signatum ou Very Old Rare Sherry), que são vinhos com mais de 30 anos. Alguns rótulos têm a idade média de até 80 anos. 



Outra verdadeira raridade é o Palo Cortado, um estilo que estaria entre o Amontillado e o Oloroso, muito aromático e complexo, exuberante no nariz. O Palo Cortado é perfeito para queijos bem maturados e para acompanhar sopas, como um creme de cogumelos. Não tem melhor companhia para um bisque de lagostas. Além de sopas esta categoria quase extinta de vinho também se entrosa bem com várias outras receitas. É um vinho que consegue encarar ingredientes muito difíceis, como ovos, aspargos, e pode ir bem até com leitão e cordeiro.



Por fim há ainda os PX, ou Pedro Ximenez, uma ampla categoria de vinhos doces, densos, escuros, complexos, imensos, é um néctar, colore a taça. O PX Viejissimo El Mastro Sierra tem cerca de 50 anos de envelhecimento. Pode ser bebido só, mas também consegue encarar um bom chocolate.




O clima da região, a Andaluzia, no Sul da Espanha, é quente e seco. Em Sanlúcar de Barrameda, onde é produzido o Manzanilla, o clima costeiro favorece o desenvolvimento de uma levedura flor mais espessa e o vinho é um pouco salgado, sendo um dos mais interessantes para se combinar com as tapas, queijos, embutidos, carnes curadas e até belisquetes de peixes e frutos do mar. Como diz o famoso anúncio do Tio Pepe na Puert del Sol, em Madri, um dos cartões-postais da cidade: “El sol da Andaluzia embotellado”, ou seja, o sol da Andaluzia engarrafado. É bom por aí mesmo. Considerando que a região é a pátria das tapas, está feito um casamento perfeito. Um Jerez e um pratinho de jamón serrano ou jamón pata negra. Um Jerez e um queijo manchego. Um Jerez e umas patatas bravas. Foram feitos um para o outro.
Há vários tipos de Jerez mas podemos fazer uma divisão básica em dois tipos:
- Fino - Quando uma camada de levedura flor se desenvolve
- Oloroso - Sem a flor, mais alcoólico e concentrado 
A partir daí há várias subcategorias, que dependem da combinação de muitos fatores. Cada produtor adota uma vinificação distinta, adicionando diferentes quantidades de álcool vínico. Também há variações do momento do corte (que este caso é a adição de álcool, que interrompe a fermentação, como no vinho do Porto), do açúcar residual, do sistema de solera.


O processo de vinificação é complexo, cheio de sutilezas. Para fazer o Fino vinifica-se primeiro um branco seco normal, com 12 graus de álcool. Deve ser um vinho limpo, com pouco tanino e muito ácido (tartárico, principalmente). Neste momento, os vinhos são selecionados e classificados. Aos melhores adiciona-se álcool vínico (produzido da destilação do vinho) até que atinja 15°, processo chamado encabezado. Vão para as botas (barricas de 490 a 600 litros feitas de carvalho americano – nunca novas). No entanto, elas não são preenchidas totalmente, e fica um espaço para contato com oxigênio – a medida deste espaço para o ar é localmente chamada de “dois punhos”, ou seja, a altura de um punho sobre o outro. Assim, as leveduras podem continuar interagindo com o Fino. 
Então acontece o milagre! Neste momento inicia-se um dos processos mais misteriosos e únicos da viticultura mundial. Sobre a superfície dos vinhos em barrica forma-se uma camada de leveduras, chamada localmente de flor. Aparecem nos meses de janeiro e fevereiro (inverno na região) e o metabolismo das diferentes leveduras do vinho (saccharomyces) deixa de ser fermentativo, ou seja, não mais se alimenta exclusivamente dos açúcares do mosto, mas também do oxigênio. 
Por causa disso, ao mesmo tempo que este processo é tido como oxidativo, o oxigênio não destrói o vinho, pois a flor passa a protegê-lo. O processo se chama “Crianza Oxidativa”. Estas leveduras se encontram naturalmente na pele da uva Palomino. 




Se o vinho for de qualidade, ele aguentará este contato com a flor, caso não seja, ele passará para outro processo de criação, para se transformar em outros tipos de produtos, como amontillado ou vinagre. 

Depois desta segunda classificação, o vinho será criado pelo método de “Soleras y Criaderas”. O nome desta forma de envelhecimento do vinho vem da disposição das barricas. Uma primeira fileira delas fica no chão, ou no solo, daí o nome de Solera, e as que se empilham sobre ela são a primeira Criadera, segunda Criadera, e assim por diante. A fileira no topo, geralmente a quinta, chama-se Añada, ou seja, a que leva o vinho da última safra. As barricas são interligadas entre elas. 


O vinho que será engarrafado vem da Solera. A quantidade que foi retirada das soleras será reposta com vinho do ano nas Añadas, no topo. As soleiras indicam a data em que começaram a ser usadas. São comuns as soleras do século 19 de há muitos do começo do século passado. 
Isso significa que quando você bebe um Jerez solera 1867, por exemplo, na sua taça, ainda que em mínima fração, há vinho com 142 anos de idade. 
Esse sofisticado sistema de amadurecimento garante consistência de safra a safra e refresca os vinhos velhos. Essa mescla de safras colabora também com a complexidade do Jerez. 



O resultado disso são vinhos com tons que vão dos esverdeados aos dourados, com predominância dos últimos. Mais evoluídos alcançam matizes acastanhados. Como já citado, no buquê tem frutas secas, amêndoas e nozes, notas cítricas, algo de caramelo, um pouco floral, muitas vezes amanteigado. Às vezes temos aromas de maresia e de giz. 
Só os vinhos produzidos na região podem ganhar o nome de Jerez, denominação regulamentada em 1933. Há uma grande uniformidade de qualidade e pode-se dizer que não existem produtores ruins. Mas há claro, os melhores. Lustau e La Gitana, por exemplo, estão entre eles.


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